segunda-feira, 4 de maio de 2009

Para Hassan

Mais uma noite sonhei com Hassan, e entre uma leitura e outra encontrei esse texto de Clarice, por instantes me vi refletida em suas palavras. Dou minha vida pelas mesmas 3 coisas.


Há três coisas para as quais eu nasci e para as quais eu dou a minha vida. Nasci para amar os outros, nasci para escrever, e nasci para criar meus filhos. "O amar os outros" é tão vasto que inclui até o perdão para mim mesma com o que sobra. As três coisas são tão importantes que minha vida é curta para tanto. Tenho que me apressar, o tempo urge. Não posso perder um minuto do tempo que faz minha vida . Amar os outros é a única salvação individual que conheço: ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca.
E nasci para escrever. A palavra é meu domínio sobre o mundo. Eu tive desde a infância várias vocações que me chamavam ardentemente. Uma das vocações era escrever. E não sei por que, foi esta que eu segui. Talvez porque para outras vocações eu precisaria de um longo aprendizado, enquanto que para escrever o aprendizado é a própria vida se vivendo em nós e ao redor de nós. É que não sei estudar. E, para escrever, o único estudo é mesmo escrever. Adestrei-me desde os sete anos de idade para que um dia eu tivesse a língua em meu poder. E no entanto cada vez que eu vou escrever, é como se fosse a primeira vez. Cada livro meu é uma estreia penosa e feliz. Essa capacidade de me renovar toda à medida que o tempo passa é o que eu chamo de viver e escrever.
Quanto aos meus filhos, o nascimento deles não foi casual. Eu quis ser mãe. Meus dois filhos foram gerados voluntariamente. Os dois meninos estão aqui, ao meu lado. Eu me orgulho deles, eu me renovo neles, eu acompanho seus sofrimentos e angústias, eu lhes dou o que é possível dar. Se eu não fosse mãe, seria sozinha no mundo. Mas tenho uma descendência, e para eles no futuro eu preparo meu nome dia a dia. Sei que um dia abrirão as asas para o vôo necessário, e eu ficarei sozinha: É fatal, porque a gente não cria os filhos para a gente, nós os criamos para eles mesmos. Quando eu ficar sozinha, estarei seguindo o destino de todas as mulheres.
Sempre me restará amar. Escrever é alguma coisa extremamente forte mas que pode me trair e me abandonar: posso um dia sentir que já escrevi o que é meu lote neste mundo e que eu devo aprender também a parar. Em escrever eu não tenho nenhuma garantia.
Ao passo que amar eu posso até à hora de morrer. Amar não acaba. É como se o mundo estivesse a minha espera. E eu vou ao encontro do que me espera.
Clarice Lispector

6 comentários:

Flavio Ferrari disse...

Eu lí até o final, pensando que o texto era seu ... sacanagem ... mas uma linda postagem, de qualquer forma.

Ernani Netto disse...

Amar é pra sempre, e é o que nos faz escrever, respirar...

Bjaum

Amiga do Cafa disse...

Clarice transbordava amor.
Era passional. Intensa. E apaixonada pela literatura.
Adorei o post.
Valeu a escolha.
Parabéns.
É sempre bom ler Clarice.

O Profeta disse...

A maresia adormeceu na areia
O mar transformou-se em espelho de água
Uma nuvem mirou-se nele
Verteu uma última gota de mágoa

Este sol que beija a ilha na manhã
Trás um sorriso cheio de mistério
Este verde orvalhado pela bruma da noite
É o tapete de um Deus no seu império


Convido-te a veres o teu mais profundo no “Espelho Mágico”


Doce beijo

♥ Driii ♥ disse...

É .. um grande texto...
E amor de mãe é único, trascendental,eterno...
Grande beijo amiga...

Nina disse...

Flavio:
Te enganei então, nossa meu ego vai explodir Clarice é única e perfeita.

Ermani:
Amor é combustível p tanta coisa

Amiga do Cafa:
Clarice é perfeita

Francisco:
Aqui ou em qq outro lugar Clarice é sempre uma boa pedida.

C:
Escrever é viver, quanto ao Hassan ele é meu futuro herdeiro, ops nao estou grávida mas a tempos ele povoa meus sonhos, Hassan é o nome que ele vai receber o mesmo do Avô.

Profeta:
Seja bem vindo

Dri:
Não sei quem inspirou quem mas estamos transbordando instito maternal amigaaa